Prestes a completar 65 anos, a filial brasileira da Mercedes-Benz comemora que, pela primeira vez, participou ativamente do desenvolvimento de um produto que será produzido e vendido na Europa.
É o Actros F, apresentado nesta quarta-feira (23) em evento virtual realizado pela Daimler, dona da Mercedes. A partir do início de 2021, ele será vendido em 24 países europeus, além de alguns outros mercados fora do continente.
O caminhão é uma versão de entrada do extrapesado Actros, o topo de linha da Mercedes. A diferença é que a nova configuração utiliza uma cabine desenvolvida pela engenharia brasileira – mais baixa do que a original, criada para a Europa.
Visualmente, é possível notar a diferença na grade - a versão europeia tem uma fileira extra.
“Esse é um projeto muito especial, e toda equipe de engenharia fez um ótimo trabalho”, disse Karl Deppen, presidente da Mercedes-Benz do Brasil.
A ideia de criar uma cabine diferente surgiu cerca de cinco anos atrás, quando a equipe brasileira viajou para a Alemanha para conhecer a nova geração do Actros.
“Quando vi a cabine que teríamos disponível no Brasil e andamos no caminhão, ficou evidente que teríamos restrições de altura em alguns locais de carregamentos com bases antigas”, disse Roberto Leoncini, vice-presidente de vendas e marketing de caminhões e ônibus da Mercedes-Benz.
Após reuniões com a matriz, o desenvolvimento de uma cabine 16,5 cm mais baixa foi aprovado – e consumiu parte dos R$ 1,4 bilhão usados na criação do novo Actros.
“Se não tivéssemos que desenvolver a cabine, teríamos gastado menos”, disse Leoncini. O investimento extra, porém, se transformou em interesse da matriz pouco tempo depois. “Eles começaram a fazer pesquisas de mercado e descobriram que haveria oportunidade de oferecer em alguns países”, completou.
Com isso, a criação brasileira será produzida também na Alemanha.
Além de oferecer maior conforto e estabilidade para os caminhoneiros do Brasil, o Actros mais baixo ainda proporciona uma redução de 1% no consumo de combustível.
Parece pouco, mas em uma frota de 200 caminhões, a economia em um ano pode chegar a R$ 500 mil – valor próximo ao preço inicial de um Actros zero.
Elétricos para europeus
O Actros F é apenas um dos recentes lançamentos da divisão de caminhões da Mercedes-Benz. Se o mundo não estivesse atravessando uma pandemia, ele seria apresentado no maior salão de veículos comerciais do mundo, o IAA, realizado a cada dois anos em Hannover.
Porém, com o cancelamento do evento, a Mercedes resolveu realizar seus lançamentos de forma virtual. Na última semana, por exemplo, a empresa mostrou dois conceitos que não emitem poluentes.
Um deles é a versão elétrica de longa autonomia do Actros – que pode percorrer até 500 km com uma carga da bateria. Seu lançamento está previsto para 2024.
A outra aposta, ainda mais ousada, é uma versão a hidrogênio, chamada de GenH2, que pode rodar até 1.000 km usando o combustível em estado líquido.
Ele armazena o hidrogênio em tanques semelhantes aos de diesel, mas que preservam a temperatura do combustível em 253°C negativos, próximo ao zero absoluto.
Antes da injeção, o hidrogênio é aquecido, e, em forma de gás, entra no sistema de célula de combustível. O residual expelido pelo escape é vapor de água.
O objetivo da Mercedes-Benz é iniciar os testes do GenH2 em 2023, e colocar o caminhão no mercado na segunda metade da década.
Só que esses planos não incluem o Brasil. Ao menos por enquanto. “Gostaria de vender no Brasil. Mas a pergunta é: quando?”, afirmou Stefan Buchner, chefe mundial da Mercedes-Benz Trucks.
O próprio executivo, que vai se aposentar no início de outubro, depois de 35 anos na empresa, respondeu que ainda não há uma estimativa de prazo para isso aconteça. E justificou:
“Estamos realmente focados nisso. Mas a infraestrutura ainda não existe no Brasil. Nós vamos continuar observando atentamente. E, quando a infraestrutura estiver pronta, nós estaremos prontos para, em um tempo muito curto, disponibilizar a tecnologia”, disse Buchner.
Sem a presença da Mercedes, o mercado de caminhões elétricos no Brasil ainda “engatinha”. Atualmente, há um modelo do tipo à venda. O segundo está na reta final de desenvolvimento.
O primeiro a chegar às lojas foi o Jac iEV 1200T, um modelo de 8 toneladas que custa R$ 350 mil. O G1 já testou.
O segundo, porém, apesar de ainda não estar disponível, foi totalmente desenvolvido no Brasil – e também será fabricado por aqui. É o Volkswagen e-Delivery, que chega no ano que vem em versões de 11 e 13 toneladas, e que também já foi avaliado pelo G1.
Gás não é solução
Outra aposta das fabricantes para reduzir a emissão de CO2 é o uso do gás como combustível.
A Scania lançou no ano passado uma linha de caminhões com essa tecnologia. Na ocasião, o diretor comercial da empresa, Silvio Munhoz afirmou que esta seria uma opção para reduzir as emissões enquanto os elétricos não são viáveis no Brasil.
De acordo com a empresa sueca, os motores podem receber gás natural veicular, já encontrado em cerca de 1,3 mil postos no Brasil, e gás natural liquefeito, que ainda não é distribuído regularmente.
Questionado se a Mercedes poderia seguir pelo mesmo caminho no Brasil, a resposta do chefe global da divisão de caminhões foi enfática.
“Nós estamos completamente cientes de que temos competidores [que usam essa tecnologia] no Brasil, mas não só aí. Mas decidimos não desenvolver a tecnologia a gás porque ela não é livre de emissões CO2. É uma tecnologia que não é o futuro. Por isso, decidimos ir para o caminho dos veículos elétricos com bateria e com célula de combustível”.
O presidente da filial brasileira ainda ressaltou que, ao menos por enquanto, a Mercedes irá continuar investindo em motores a diesel.
“Diesel ainda é importante no futuro para pelo menos em alguns países fora da Europa e da Ásia. E por isso, é nosso dever desenvolver esse tipo de motor.”
VÍDEOS: veja mais conteúdos sobre caminhões