Câmbio 6DCT250 foi usado por Renault, Volvo, Ford e ainda está em uso por fabricantes chinesas (Getrag/Divulgação)
O nome “Powershift” é capaz de provocar calafrios em proprietários e ex-proprietários de carros da Ford no Brasil e no mundo.
Mas a famigerada caixa de dupla embreagem não é exclusiva da fabricante norte-americana e segue viva, de certa forma, nos Caoa Chery Tiggo 5X e Tiggo 7.
A transmissão de dupla embreagem Powershift foi criada pela Getrag Ford Transmissions GmbH, uma joint-venture entre a Ford e a tradicional fabricante alemã Getrag (renomeada em 2018 para Magna Powertrain).
Alavanca de câmbio do Caoa Chery Tiggo 7 (Fernando Pires/Quatro Rodas)
O primeiro câmbio desta parceria foi o 6DCT450, lançado em 2008 nas versões diesel do Ford Focus para a Europa.
Com seis marchas, embreagens imersas em óleo, atuadores hidráulicos e capacidade para suportar até 45,9 mkgf de torque, também foi usada por modelos da Volvo e até por versões a diesel dos Dodge Journey e Avenger, e do Chrysler Sebring.
A segunda geração do Powershift é representada pelo 6DCT250, lançado em 2010 para ser usado nos Renault Mégane e Scénic, e nos Ford Fiesta produzidos no México.
Caoa Chery Tiggo 5X (Acervo/Quatro Rodas)
Posteriormente, também seria aplicado em versões do Focus, B-Max e no EcoSport, além dos Renault Captur, Clio (inclusive o R.S.) e Kadjar, e nos modelos da Qoros, marcha chinesa criada por uma joint-venture entre a Chery e o fundo israelense Kenon Holdings – hoje a Chery detém apenas 25% da marca.
O 6DCT250 (que a Ford chama internamente de DPS6 – o nome Porwershift pertence à Getrag) é uma transmissão com embreagens secas (como o DSG de sete marchas do Volkswagen Golf alemão), atuadores eletromecânicos e que suporta entre 24,5 e 28,5 mkgf de torque, dependendo da aplicação.
Neste conjunto, o óleo (entre 1,7 e 1,9 litro) fica restrito ao compartimento das engrenagens.
As três principais famílias dos câmbios de dupla embreagem da Getrag (Getrag/Reprodução)
Foi justamente esse óleo que deu tanta dor de cabeça à Ford no mundo inteiro.
No Brasil, barulho, trepidação, superaquecimento e até necessidade de trocas prematuras do kit de embreagem foram relatados por proprietários de New Fiesta, Focus e EcoSport no Brasil a partir de 2014. E resultou em ações do Procon.
Em 2015, a Ford disse que os problemas de trepidação poderiam ser resultado da contaminação de uma das embreagens por fluido de transmissão.
“Esse pequeno merejamento da embreagem, quando ocorre, pode causar a leve trepidação sentida pelos consumidores, e corresponde ao mesmo sintoma do desgaste natural da embreagem de uma transmissão manual tradicional”, dizia o informe oficial protocolado junto ao Procon-SP.
“A diferença é que, no caso em tela, esse sintoma aparece de maneira antecipada, antes do fim da vida útil da embreagem”, completava.
Câmbio Powershift do Ford New Fiesta (Acervo/Quatro Rodas)
A solução para esta falha seria a adoção de um novo vedador da transmissão com fluorocarbono em veículos zero-quilômetro.
Já os modelos usados (Fiesta e EcoSport 2013 e 2014, e Focus 2014) afetados pelo problema receberiam uma nova embreagem gratuitamente, além da extensão da garantia de três para cinco anos, ou 160 mil quilômetros rodados – o que ocorresse primeiro.
Neste ano veio à tona que a Ford tinha ciência dos problemas relacionados do câmbio Powershift antes mesmo de colocar à venda os Fiesta e Focus envolvidos no caso.
Atualmente, a fabricante é alvo de ações coletivas nos EUA, que alegam que os clientes foram defraudados. Apesar das negações da Ford, há também ações coletivas na Austrália e Tailândia.
O tempo passou. O EcoSport passou a ser equipado por um novo câmbio automático de seis marchas e Focus e Fiesta deixaram de ser vendidos no Brasil. Mas a transmissão 6DCT250 ainda está presente em carros novos.
Caoa Chery Tiggo 7 (Acervo/Quatro Rodas)
No início de 2017 (meses antes da Qoros ter seu controle vendido ao Baoneng Group), a Chery anunciou parceria com a Getrag para o fornecimento de seu câmbio de dupla embreagem para o Tiggo 7.
O câmbio é o mesmo 6DCT250, ou seja, o velho Powershift, mas desta vez fabricado pela Getrag-Magna em Nanchang, sendo também usado por modelos de Great Wall, Geely e até pelo Jiangling Yusheng S330 (que veremos no Brasil como Ford Territory, embora este último utilize câmbio CVT na China e ainda não se saiba qual trem de força utilizará em nosso país).
Lista mostra todos os carros chineses equipados com o câmbio 6DCT250 (Internet/Reprodução)
Além de exaltar as trocas de marcha em 0,2 segundo e a redução de 10% no consumo na comparação com o câmbio manual disponível até então, a Chery afirma que a transmissão DCT adotada em seu SUV já conta com um novo conjunto de embreagens que incorpora o chamado “amortecedor K2” e materiais com melhor desempenho térmico.
O objetivo disso é diminuir reações abruptas da transmissão, reduzir o ruído e garantir trocas de marcha mais suaves.
Versão usada pela Chery tem embreagem diferente (Reprodução/Chery)
Além disso, a unidade de gerenciamento da transmissão tem calibração específica para os carros da Chery.
Na prática, não deixa de ser um câmbio Getrag Powershift. Mas, após quase dez anos de mercado e tantas aplicações (bem e malsucedidas), pode ser que já tenha resolvido seus vícios.
– (Getrag/Reprodução)
Em tempos atuais, o 6DCT250 é o único câmbio de dupla embreagem fabricado na China pela Magna. Seu foco no ocidente é uma nova geração de transmissões de dupla embreagem lançada em 2015.
As 6DCT150, 6DCT200 e 7DCT300 são modulares, têm embreagens úmidas e trabalham com atuadores eletro-hidráulicos (com bomba que atua sob demanda), misturando características das 6DCT450 e 6DCT250.
Além disso, as caixas 200 e 300 têm variantes para aplicações híbridas.
Por sinal, a 7DCT300 é a nova Steptronic de sete marchas usada pelos BMW e Mini com tração dianteira. No Brasil, esteve presente nos primeiros X2 a gasolina e agora pelos novos Mini Cooper. Já a Renault o chama de câmbio EDC na Europa.