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11 MAR
O dia em que batemos Corsa, Gol, Fiesta e Palio. E até geramos um recall

O dia em que batemos Corsa, Gol, Fiesta e Palio. E até geramos um recall

 (Acervo/Quatro Rodas)

Publicado originalmente na edição de novembro de 2000.

São Paulo, 16 de outubro de 2000, 16h30. Cinco homens estão reunidos com QUATRO RODAS. Todos trabalham na Fiat. O engenheiro Lorenzo Rosti Rossini, maior autoridade da área de carrocerias da fábrica, acaba de chegar de Turim, Itália, só para a reunião.

Na bagagem ele traz duas pastas com laudos técnicos. O motivo da reunião: anunciar que a Fiat faria o maior recall de sua história no Brasil. A partir de 6 de novembro, serão convocados 320 000 Palio 1.0 para ajustes na fixação do cinto de segurança.

A notícia coincide com outro mega recall, desta vez da GM, que chamou os donos de Corsa para trocar uma peça também no sistema do cinto de segurança.

Para a Fiat, a missão dos executivos era o desfecho de uma corrida contra o tempo que durou 32 dias, desde que uma peça de fixação do cinto de segurança do Palio EX se rompeu, no crash test feito por QUATRO RODAS.

As cores claras e opacas facilitam a visualização dos carros. (Acervo/Quatro Rodas)

São Bernardo do Campo, 14 de setembro de 2000, 11h30. O ruído estridente da sirene injeta tensão num dos laboratórios de teste da VW.

É um galpão de 500 metros quadrados, coberto com telhas de amianto. O técnico João Carlos Pereira aciona o motor que movimenta o cabo de aço pelo qual o carro é tracionado.

Por baixo, as cores diferentes identificam cada componente a ser analisado. (Acervo/Quatro Rodas)

Em menos de 10 segundos, um modelo zero-quilômetro carregado com US$ 450.000 em equipamentos vai se espatifar contra um monolito de 250 toneladas.

O engenheiro da Fiat, o siciliano Lorenzo Vita, ajeita a longa cabeleira. Ele é um dos responsáveis pelo projeto da carroceria do Palio.

No porta-malas, 25 quilos de equipamentos, cabos e sensores que trapassam as lanternas (Acervo/Quatro Rodas)

Como todos os espectadores, protegidos atrás de um painel de madeira entrecortado por visores de vidro, Vita mantém os olhos fixos na área amarela e preta no paredão.

É nesse retângulo que o carro vai se chocar a quase 50 km/h. Imagine-se sem cinto de segurança dentro de um carro, despencando do quarto andar de um prédio.

Lâmpadas suplementares garantem a iluminação interna para a filmagem do movimento dos dummies. (Acervo/Quatro Rodas)

O impacto a 48,3 km/h contra uma barreira rígida tem essa equivalência. Um vulto amarelo irrompe no salão, puxado pelo cabo de aço.

De repente, há o estrondo produzido por quase 1000 quilos de aço, matéria plástica e vidro contra o concreto. O ruído da sirene cessa.

Bancos e cintos são posicionados para receber os manequins. (Acervo/Quatro Rodas)

É o fim da destruição científica de um veículo. Vita solta a respiração e corre para examinar os destroços do Palio. Aproxima-se do carro, observa o interior. Arregala os olhos, franze a testa, para logo em seguida retomar o ar tenso.

No espaço de três semanas, quatro carros 1.0, comprados em São Paulo, foram submetidos ao mais severo teste criado pela engenharia automotiva.

Os dummies pesam 75 quilos. (Acervo/Quatro Rodas)

É a primeira vez que uma revista banca esse tipo de trabalho na América Latina. E mesmo em outros países contam-se nos dedos de uma mão as revistas que compram carros para destruí-los com o mesmo objetivo: expor o grau de segurança dos veículos.

O teste de QUATRO RODAS acontece em um momento em que recalls gigantescos estão sendo anunciados em todo o mundo.

Só falta prender o cabo de aço para rebocar o carro contra a parede (Acervo/Quatro Rodas)

O Brasil não ficou de fora. Em 12 de outubro, surgiu a informação do recall de 1,3 milhão de Corsa, produzidos entre 1994 e 1999.

O problema é na fixação dos cintos de segurança dianteiros. A GM sofreu severas críticas quando se divulgou que o defeito era conhecido desde abril de 1999 e só agora, mais de um ano depois, ela anunciava o recall.

Os vestígios da destruição (Acervo/Quatro Rodas)

(Correu a versão de que o problema teria sido descoberto no teste de QUATRO RODAS. Não é verdade, pois o modelo avaliado era ano 2000.)

A prova feita pela revista não tem a intenção de mostrar qual, entre os quatro carros, é o mais seguro. Para isso, seriam necessários vários choques além da batida frontal.

Nessa experiência pioneira, o maior objetivo foi mostrar o nível de segurança dos automóveis brasileiros e, mais do que isso, incentivar a discussão sobre o assunto no país – tema que já faz parte do dia-a-dia de muitas nações, do Japão aos Estados Unidos.

Mesmo envolvendo apenas o choque frontal, a prova da revista foi cercada de tensão. “Um crash envolve muitas horas de trabalho minucioso e muito, muito dinheiro”, diz o espanhol Joaquim Huguet, o comandante de uma equipe de engenheiros de segurança do IDIADA Automotive Technology, em Barcelona, um dos mais avançados centros de tecnologia automotiva da Europa.

O carro é afastado da parece para remoção dos dummies (Acervo/Quatro Rodas)

Huguet foi trazido ao Brasil por QUATRO RODAS para auditorar o teste ” não existem no país centros independentes de crash test. Há dois laboratórios no país: o pioneiro, da Volkswagen, em São Bernardo do Campo (que acabou sendo escolhido por sorteio e alugado pela revista), e o da GM, em Indaiatuba, São Paulo.

As informações foram processadas e analisadas no IDIADA e o parecer final, assinado por Huguet.

Pelo vestígio de tinta no corpo do dummy contra o painel, é possível marcar áreas agressivas do interior do veículo (Acervo/Quatro Rodas)

No documento, o especialista destaca a fragilidade dos sistemas de retenção dos passageiros nos carros testados – pela ordem de batida, Corsa Wind, Gol, Fiesta GL e Palio EX.

“Apenas um dos veículos, o Palio, ofereceu risco real aos ocupantes porque as peças onde os cintos são fixados não suportaram o esforço (mais detalhes na página 99). De modo geral, todos os modelos revelaram fragilidade ao permitir o contato da cabeça do motorista no volante e, em alguns casos, da cabeça do passageiro no painel.”

A deformação da carroceria é medida pelo adesivo com riscos e círculos. (Acervo/Quatro Rodas)

O teste foi decidido em consenso entre a direção da revista e representantes das quatro fábricas envolvidas – GM, Volkswagen, Ford e Fiat.

O crash frontal contra barreira rígida a 30 milhas por hora (48,3 km/h) seguido de capotamento estático (manobra na qual o veículo é fixado em uma plataforma rotatória para checar vazamento de combustível) teve como base a norma FMVSS 208, um dos principais instrumentos do governo dos Estados Unidos para avaliar o grau de segurança dos veículos.

Os veículos foram escolhidos por vendas e equivalência dos modelos. Nos bancos dianteiros dos carros foram colocados dummies para medir as conseqüências do impacto na cabeça – o índice HIC, iniciais de Head Injury Criterion, ou critério de lesão na cabeça –, tórax e fêmur.

O HIC é um dos principais índices para determinar o nível de segurança de um veículo. Mas não é o único: a máxima desaceleração sofrida pela cabeça no momento do impacto também é um dado revelador.

Técnico observando danos no interior do carro durante o teste de impacto. (Acervo/Quatro Rodas)

Na prova de QUATRO RODAS só o HIC foi levado em consideração, de acordo com a norma 208. O resultado está nos quadros publicados nas páginas seguintes, junto com a tolerância admitida pela norma americana.

É mais do que se exige no Brasil para a homologação de um veículo. A portaria 463/73, em vigor desde 1977, obriga apenas o impacto frontal a 30 milhas por hora contra barreira rígida.

E não pede manequins. Até aqui, apenas os fabricantes conheciam as conseqüências desse tipo de colisão. Pela primeira vez no Brasil, você começa a ter acesso a essas informações.

O crash test de QUATRO RODAS consumiu 1560 horas/trabalho de preparativos dos quatro carros. E, entre engenheiros, técnicos, jornalistas e auxiliares, envolveu diretamente cerca de trinta pessoas

A operação custou, no total, cerca de 180 000 reais, entre despesas com a compra dos veículos, aluguel do laboratório da Volkswagen, contratação do auditor e transporte.

O veículo foi transportado para a prova do capotamento estático, que acusa eventuais vazamentos de combustível. (Acervo/Quatro Rodas)

O valor dos quatro carros representou 38% do total. O Palio EX, de 15 800 reais, foi o mais barato e o Corsa Wind (19 140 reais), o mais caro.

O primeiro crash test foi feito em 1915 nos Estados Unidos pela Dodge. O carro era solto do alto de uma rampa de madeira de 800 metros de extensão até se espatifar contra um muro. No Brasil, o primeiro teste aconteceu em 1971 com uma Variant, da Volks

Dois especialistas estrangeiros foram trazidos pelas fábricas para acompanhar o crash. O inglês John Charles, da Ford, um dos responsáveis pelo projeto do Fiesta, e Lorenzo Vita, que trabalhou no desenvolvimento do Palio em Turim

Teste de impacto do Fiesta, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

O espanhol Joaquim Huguet também aprendeu em sua estada no Brasil. Deve implantar no IDIADA uma solução do laboratório da Volks, uma frigideira com o fundo recortado.

O utensílio serve como eficiente aparador para evitar que os borrifos de tinta spray, usada para a pintura da numeração dos carros, se espalhem pela lataria

As cores claras e opacas facilitam a visualização dos carros. Por baixo, as cores diferentes identificam cada componente a ser analisado. No porta-malas, 25 quilos de equipamentos, cabos e sensores que traspassam as lanternas.

Lâmpadas suplementares garantem a iluminação interna para a filmagem do movimento dos dummies. Bancos e cintos são posicionados para receber os manequins que pesam 75 quilos.

Joaquim Huguet, auditor, medindo a resistência de abertura da porta do Fiesta GL. (Acervo/Quatro Rodas)

Só falta prender o cabo de aço (9) para rebocar o carro contra a parede

O auditor Huguet mede a resistência de abertura das portas. O carro é afastado da parede para remoção dos dummies. Pelo vestígio de tinta no corpo do dummy contra o painel, é possível marcar áreas agressivas do interior do veículo.

A deformação da carroceria é medida pelo adesivo com riscos e círculos. Técnicos observam os danos no interior do carro e o veículo é transportado para a prova do capotamento estático, que acusa eventuais vazamentos de combustível.

Dez, nove, oito… crash!

 (Acervo/Quatro Rodas)

São 100 horas de preparativos para tudo terminar em 200 milissegundos. Acompanhe em câmera lenta

No início da pista de concreto, 100 metros antes da barreira, o carro foi checado pela última vez. A sirene anuncia o início do teste: o motor que movimenta o cabo de aço amarrado ao veículo é acionado

Neste ponto, o carro tracionado pelo cabo já está seguindo à velocidade de 48,3 km/h. Se for notado algum problema, ainda é possível acionar os freios de emergência instalados no carro e interromper o teste

Aqui dentro, um operador está atento à passagem do carro pelo cone. Quando isso ocorre, estarão faltando apenas 3 segundos para o impacto. O equipamento que capta as informações dos sensores é acionado e as filmadoras são disparadas.

A haste fixada no teto está cortando dois feixes de raio laser na canaleta suspensa e registrando a velocidade exata no momento do choque.

O impacto dura exatos 200 milisegundos, mais rápido que um piscar de olhos. A barreira rígida de concreto pesa 250 toneladas, tem dois metros de altura e três metros de profundidade.

Saco de pancadas

Os dummies usados nos testes têm 1,76 metros de altura e pesam 75 quilos. Eles simulam as reações do corpo humano da maneira mais próxima que a tecnologia permite.

Para isso, são instalados sensores na cabeça, no pescoço, no tórax e nas pernas. As informações coletadas são enviadas para um computador e traduzidas em números. A partir do processamento desses dados é feita a análise.

Pronto para bater

As informações são enviadas ao computador por cabos.

Uma caixa blindada armazena os dados fornecidos pelos sensores no carro e nos bonecos. Os freios de emergência também são instalados no porta-malas.

As siglas identificam os diferentes carros por ordem de batida e a sequência de testes feitos pelo laboratório.

O piano, faixa que lembra um teclado, e os círculos, ou miras, servem para que se determine a deformação da carroceria e o deslocamento dos bonecos.

O carro é acorrentado ao suporte, ou skate, que se encaixa no trilho da pista. O skate é centralizado a partir do logotipo no capô.

Sete câmeras registram em 16 milímetros o momento do choque em diferentes ângulos. São equipamentos especiais, capazes de filmar 1.000 quadros por segundo.

O Corsa depois do crash

Teste de impacto do Corsa Wind, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

O desempenho do Chevrolet Corsa Wind no crash test é avaliado da seguinte forma pelo engenheiro Joaquim Huguet, auditor contratado por QUATRO RODAS para esse trabalho:

“Os sistemas de retenção do veículo podem ser melhorados para minimizar os efeitos do contato do tórax e da cabeça do motorista contra o volante.”

O cinto do passageiro também não impediu o contato da cabeça do dummy com o painel, embora a batida tenha ocorrido com menor intensidade.

“No caso do motorista, a parte inferior do aro do volante foi deformada pelo impacto do tórax e, logo em seguida, foi a cabeça que se chocou contra a parte superior do aro. A seguir, houve contato do queixo do dummy no centro do volante”, diz o relatório do IDIADA AT.

Teste de impacto feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

“Esse contato da cabeça com o volante”, prossegue a equipe técnica do IDIADA AT, “provoca um valor do índice HIC, próximo ao limite estabelecido atualmente pela norma americana.”

O contato do joelho esquerdo do motorista com a coluna de direção, no entender dos especialistas, ajudou na manutenção dos valores de aceleração do tórax até que este se chocasse contra o volante.

Ele recomenda que as zonas suscetíveis de impacto com o joelho sejam melhoradas no Corsa.“As estruturas rígidas devem ser modificadas de modo a reduzir a agressividade dessas zonas com o corpo dos passageiros durante o contato.”

Teste de impacto do Corsa Wind, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

Depois do choque, ambos os dummies estavam corretamente situados dentro do veículo. E a força aplicada para liberar os cintos de segurança.

Huguet considerou que a estrutura do veículo apresentou deformação correta. “Toda a energia da colisão foi absorvida pela parte dianteira do veículo, sem provocar redução significativa no compartimento dos passageiros.”

Ele também salientou que não se observou nenhuma deformação, intrusão ou ruptura na zona dos pés, nem no assoalho que pudesse prejudicar os passageiros.

 (Acervo/Quatro Rodas)

A GM fala

“Os resultados estão dentro da faixa considerada normal para esse tipo de teste. O uso do airbag certamente ofereceria uma proteção adicional. Nós temos essa opção no produto.

Quanto às sugestões do consultor contratado por QUATRO RODAS, acredito que as melhorias são naturais e vêm sendo feitas de maneira contínua. A realização do teste foi uma ótima iniciativa e os ensaios foram conduzidos adequadamente”, José Fernando Penteado, diretor de Engenharia de Carrocerias

O Gol depois do crash

Teste de impacto do Gol, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

A análise do comportamento do Gol 1.0 8V, feita pela equipe de engenheiros do IDIADA AT, é a seguinte: “Também no caso do Gol os sistemas de retenção podem ser melhorados para minimizar os efeitos do contato da cabeça do motorista com o volante”.

O impacto, conforme análise do engenheiro, deu-se exatamente no centro do volante. “O movimento da coluna de direção durante o choque evitou que o tórax fosse afetado mas, em contrapartida, não impediu que todo o rosto fosse atingido, provocando um impacto especialmente forte.”

O comportamento do cinto do passageiro foi mais adequado porque impediu que a cabeça se chocasse contra o painel. O gráfico ao lado mostra os índices obtidos tanto pelo motorista quanto pelo passageiro.

Gol em testes pela Quatro Rodas (Acervo/Quatro Rodas)

Joaquim Huguet recomenda, igualmente, que a parte inferior do painel, local que pode ser atingido pelo joelho do motorista, seja aperfeiçoada. Segundo ele, a estrutura nesse local é muito rígida e isso pode ocasionar ferimentos.

“Observamos ainda a quebra e soltura de algumas peças do painel. O fato preocupa porque podem surgir partes cortantes e agressivas para os ocupantes do veículo.”

A deformação da estrutura do Gol – único modelo a contar com motor longitudinal entre os quatro – foi correta no entender do especialista. “Nada que pudesse prejudicar a integridade do compartimento dos passageiros foi observado: a maior parte da energia foi absorvida no compartimento do motor.”

Teste de impacto do Gol, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

O pára-brisa partiu-se ligeiramente na base, mas a peça manteve-se na posição original e impediu a intrusão de objetos.

“Todas as portas do veículo puderam ser abertas sem o uso de ferramentas depois do choque, facilitando desse modo um rápido acesso a todos os passageiros. O maior esforço teve de ser aplicado na abertura da porta dianteira direita devido à deformação produzida nesse lado do veículo.” Não houve vazamento de combustível.

 (Acervo/Quatro Rodas)

A Volks fala

“O resultado ficou dentro daquilo que já sabíamos a partir dos crashes que fazemos mensalmente. Para um carro sem airbag, o Gol teve um bom comportamento, abaixo do limite estabelecido pelas normas. A soltura de peças plásticas é conseqüência do acabamento de um popular: pode causar cortes ou arranhões, mas dificilmente irá matar. Esse problema pode ser corrigido”, Marcelo Bertocchi, supervisor da engenharia de segurança e predições veiculares.

O Fiesta depois do crash

Teste de impacto do Fiesta GL Class 1.0, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

O Ford Fiesta GL Class testado por QUATRO RODAS obteve o seguinte parecer dos especialistas do IDIADA AT: “O cinto de segurança também não impediu que a cabeça do motorista atingisse o volante. O choque acabou deformando a parte superior do aro e, ao se deformar, a peça absorveu energia.”

A análise dos dados revela que instantes após o impacto a coluna de direção se desloca para baixo, reduzindo a força do impacto na cabeça do motorista. “O cinto de segurança reteve suficientemente o acompanhante, evitando o contato da cabeça com o painel.”

Teste de impacto do Fiesta GL, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

Um dos problemas notados no Fiesta, de acordo com o engenheiro Joaquim Huguet, foram as peças plásticas do painel que se soltaram ou se romperam. “É um comportamento indesejável porque, além de poder atingir os passageiros no momento do choque, essas peças têm cantos vivos e cortantes.”

A recomendação de que o fabricante substitua a estrutura rígida do painel por outra, que absorva melhor a energia, também é válida para o modelo Ford. “Os sinais de compressão no fêmur dos ocupantes comprovam a rigidez desses componentes.”

A estrutura da carroceria foi preservada após o choque. “A energia da colisão foi absorvida perfeitamente pela parte dianteira do veículo, em grande parte dentro do compartimento do motor, sem provocar nenhuma redução significativa no espaço dos passageiros.”

Teste de impacto do Fiesta GL, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

Depois do choque, ambos os dummies estavam corretamente situados. “Cintos, bancos, apoio de cabeça e encosto dos bancos estavam corretamente posicionados.”

O pára-brisa manteve-se intacto apesar da violência do choque: nenhum objeto penetrou no interior da cabine. E todas as portas puderam ser abertas sem uso de ferramentas.

A maior força aplicada foi na abertura da porta dianteira direita, devido à deformação da coluna. Depois da colisão, não se verificou vazamento de combustível no capotamento estático.

 (Acervo/Quatro Rodas)

A Ford fala

“O impacto contra o volante é esperado em um veículo sem airbag. Por isso, não vejo ineficácia nos sistemas de retenção. Quanto às peças internas que se soltaram, elas podem provocar ferimentos. É um item a ser melhorado. Não significa que exista a intenção de rever o desenho do painel, mas há a possibilidade de melhoria. Seria um cuidado extra dos fabricantes para maior proteção dos passageiros”, Eduardo Burgos, gerente de engenharia ambiental e segurança.

O Palio depois do crash

Teste de impacto do Palio EX 1.0, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

O Fiat Palio EX 1.0 expôs motorista e passageiro “a uma situação de risco, embora isso não tenha se manifestado nos resultados dos dummies”, segundo parecer do engenheiro Joaquim Huguet.

A peça do banco do passageiro na qual o fecho do cinto de segurança se ancora rompeu-se. E a do banco do motorista esteve a ponto de se romper no momento da colisão do carro contra a parede (veja mais detalhes do acidente nas páginas seguintes).

“O impacto da cabeça do motorista com a parte superior do aro do volante foi tão forte que produziu um valor de HIC superior ao estabelecido atualmente como limite pela norma americana”, relata Huguet.

Teste de impacto do Palio EX, feito pela Quatro Rodas. (Acervo/Quatro Rodas)

Antes do impacto da cabeça, houve choque do tórax do motorista contra o volante, primeiro na parte inferior, causando deformação na peça, e logo em seguida no centro do volante.

No caso do acompanhante, diz o engenheiro, a ruptura da peça aconteceu 70 milissegundos depois do impacto. “A fratura da peça deixou o passageiro sem retenção após o choque e, a partir desse instante, joelho, tórax e cabeça se chocaram contra o painel e o pára-brisa. O acompanhante obteve bons valores no teste porque o rompimento do cinto se produziu no final do choque, atuando como limitador de carga.”

Teste de impacto do Palio EX, feito pela Quatro Rodas (Acervo/Quatro Rodas)

Por considerar que a quebra da base do cinto não retrata uma situação normal e que a interpretação dos números poderia levar a falsas interpretações, QUATRO RODAS decidiu não divulgar os valores.

Por isso, no gráfico ao lado, o boneco que representa o passageiro encontra-se em branco e as barras não trazem os valores aferidos no teste.

Apesar do incidente, a estrutura do veículo comportou-se bem, sinal de que a carroceria do Palio absorveu eficazmente o choque. “Não houve deformações significativas: o compartimento dos passageiros manteve-se íntegro.” Nenhuma porta foi aberta com ferramentas e não houve vazamento de combustível.

 (Acervo/Quatro Rodas)

A Fiat fala

“Nos testes, houve um grande espírito de colaboração para levar ao consumidor o primeiro crash test desse porte feito no Brasil. Foram tomados todos os cuidados para garantir a isenção dos resultados, como a presença do auditor contratado por QUATRO RODAS, um profissional muito experiente. Esse trabalho revela que os engenheiros brasileiros são capazes de fazer testes tão precisos quanto os de lá”, Marco Saltini gerente do Serviço Técnico Legislativo.

Sete milímetros. E crash!

Os donos dos 320.000 Palio fabricados desde maio de 1998 e que estão sendo chamados agora para ajustes no cinto de segurança correram ou correm risco de vida? Para a Fiat, a resposta é não.

“O carro é absolutamente seguro”, afirma Appio Aguiari, diretor técnico da montadora. “Decidimos pela convocação apenas para tranqüilizar os nossos consumidores.” Ele garante que não há registro de acidentes originado pela ruptura do suporte do cinto.

Haste do banco do Palio EX quebrada durante o teste de impacto feito pela Quatro Rodas (Acervo/Quatro Rodas)

Se é assim, por que a peça se rompeu no crash test?

Durante 2 horas, na tarde da segunda-feira 16 de outubro, os cinco homens da Fiat (o próprio Aguiari, o diretor de comunicação Marco Antônio Lage, o responsável pelo serviço técnico legislativo e normativo, Marco Antonio Saltini, o assessor técnico Carlos Henrique Ferreira, todos de Betim, e mais o engenheiro Lorenzo Rosti Rossini, da Fiat Auto, de Turim) procuraram convencer QUATRO RODAS de que o teste, feito com base na norma americana 208, não seria representativo.

“Nossos carros são testados conforme critério europeu”, afirmou Lorenzo Rossini. “E por essa norma, mais rigorosa, não constatamos nenhum tipo de problema no Palio.”

Colisão do Palio EX 1.0 contra a parede de concreto, o que provocou problemas nos cintos de segurança do motorista e passageiro e o choque dos bonecos contra o volante e painel, durante teste de impacto feito pela Quatro Rodas em um laboratório da Volkswagen. (Acervo/Quatro Rodas)

Pelo padrão europeu, o veículo se choca a 40 milhas por hora (64 km/h), contra uma barreira deformável, batendo 40% da área frontal do carro, sempre do lado do motorista.

No americano, o choque é feito a 30 milhas por hora (48,8 km/h) num obstáculo rígido, atingindo 100% da área frontal.

O fato é que as quatro montadoras participantes concordaram previamente em usar a norma 208. E no teste, a peça do Palio usada para fixação do fecho do cinto do passageiro rompeu-se com o choque.

Joaquim Huguet, auditor, e Lorenzo Vita, engenheiro da Fiat, durante teste de impacto feito pela Quatro Rodas no Palio EX. (Acervo/Quatro Rodas)

O componente metálico, de 19 cm de comprimento por quatro centímetros de largura, é parte da estrutura do banco. E, ao se desprender, ricocheteou com violência no interior do veículo a ponto de produzir um corte de quatro centímetros de largura por três centímetros de profundidade na borda do encosto do banco do passageiro.

O mesmo suporte metálico do banco do motorista também rasgou e esteve a ponto de se romper, mas o impacto da cabeça do dummy contra o volante aliviou a carga na peça. A lesão provocada pelo choque superou os índices toleráveis estabelecidos pela norma americana.

O que teria originado o problema é prosaico. De acordo com os laudos da Fiat, a redução de 7 mm no espaçamento entre a haste do fecho do cinto e a base do banco teria submetido o conjunto a um esforço extra não previsto.

Rompimento do cinto do Palio EX 1.0, durante teste de impacto feito pela Quatro Rodas em um laboratório da Volkswagem. (Acervo/Quatro Rodas)

A solução teria sido adotada em todos os modelos 1.0 da família Palio fabricados a partir de maio de 1998 porque a haste atrapalhava o manejo da alavanca do freio de mão, quando o banco dianteiro ficava na posição mais avançada.

A solução encontrada pela Fiat para reduzir o esforço no conjunto foi a colocação de um espaçador de 4 mm e de uma arruela de 1 mm entre as peças metálicas.

A origem do problema foi descoberta em Turim. Tão logo ocorreu o acidente do crash, dois Palio EX teriam sido despachados para a Itália de avião. E lá, diz a Fiat, submetidos ao mesmo tipo de teste realizado pela revista.

Nada de anormal foi constatado, de acordo com Rossini. Ainda assim, a empresa preferiu fazer a convocação dos 320 000 Palio 1.0, incluindo a Weekend, Siena e Strada com sistema de reclinação do encosto do banco por alavanca.

O problema no cinto do Corsa

No dia 16 de outubro, a GM convocou 1.060.110 donos de Corsa para instalar um kit que pode impedir a soltura da placa onde o fecho do cinto é fixado. O problema afeta os carros fabricados em 1999.

Não tem, portanto, relação com o crash de QUATRO RODAS, feito com um Corsa Wind 2000. Quando houve o anúncio, a GM já conhecia 25 acidentes nos quais acredita-se ter havido fadiga do material da peça – em dois deles com morte.

O primeiro foi em abril de 1999 – dezoito meses antes do recall. Segundo a GM, a demora se deve ao processo de investigação e ao desenvolvimento e produção dos kits.

 (Acervo/Quatro Rodas)

“Chegamos à solução ao analisar, com um microscópio, a peça de veículos com alta quilometragem”, diz Carlos Buechler, engenheiro-chefe da GM.

O recall também vale para os 2.667 brasileiros donos de Tigra, cupê construído sobre a plataforma do Corsa. O Tigra é feito na Europa, mas, a exemplo de todos os Corsa do mundo, usa uma base de fixação dos bancos alemã.

A regulagem para as esburacadas ruas brasileiras, que faz a suspensão transmitir mais força aos componentes do banco, seria uma das causas do desgaste na placa do cinto.

Nos exames feitos pela GM em modelos europeus, nada foi constatado, mas sabe-se que a empresa está de sobreaviso caso problema semelhante surja em qualquer dos 80 países onde o Corsa é vendido.

Fonte: Quatro Rodas

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